segunda-feira, 2 de junho de 2014

Ode till mig, min äldsta vän och min ärkefiende, del IV.

Claro que eu não vou agora cuspir no prato em que eu comi por tanto tempo e dizer que foi tudo horrível. Passar esse tempo contigo me fez aprender muito. Eu jamais teria criado tal pele, tal armadura, tal escudo intelectual que eu vou levar pra vida toda; sempre vão dizer que eu sou assim pelos outros, mas foste tu quem me fez assim, e nós sabemos disso. Nós sabemos que minhas cicatrizes foram todas forjadas por ti, assim como todos os curativos. Acho que a expressão que se usa é "bate e assopra", algo assim. Nós sabemos que todos os insultos mais marcantes vieram de ti, assim como os carinhos aos ouvidos, as massagens egóicas (ou seriam egoístas, puramente?). Então vamos deixar bem claro que a maior responsabilidade por quem eu fui naqueles tempos, e que estranho é falar deles assim, tão distantes, é tua.

Deixo claro aqui que tu não tens mais influência sobre mim hoje. Quero abudiar essa noção. Não, pode parando por aí, eu sei que tu vais contestar, bater pé e teimar, eu lembro bem como era isso, mas hoje não. Hoje eu vou te colocar no teu lugar e tu vais ter que aceitar, mesmo que sob protesto, que tu não és mais o meu pilar principal. Hoje o foco está nas pintas próximas ao umbigo, nas manchas violetas no meu pescoço, nos nós dos meus dedos, nos nós de outros dedos na minha pele, naqueles olhos de âmbar que caem sobre mim com tanta ternura. Aliás, se não me engano era isso que me prometeste: ternura, carinho, amor, proteção. Nada disso veio de ti, veio de mim, só de mim. Porém, como eu disse, eu não vou me comprometer a te refutar completamente. Tu foste parte de mim por muito tempo. Não posso fingir que nada aconteceu ou tu farias o favor de ser pra sempre o elephant in the room da minha vida. E eu não quero te manter, eu quero me livrar.

Não considere isso uma carta de despedida; como eu disse, é um ode. Ok, não é um ode, não há poesia nenhuma aqui, não há ritmo algum, só há a paixão. E nem digo que não há poesia como uma metáfora; literalmente, não há nada de poético nos nossos anos em companhia. O que houve foi um horror e eu espero que tu saibas disso. Acho que tu inclusive já sabias. Minto. Eu sei que tu inclusive já sabias. Não dá de mentir aqui, (in)felizmente. É doloroso pensar que tu me infligiste tanto sofrimento propositalmente, conscientemente, planejadamente. Eu lembro de tudo, o que de certa forma me protege de deixar que tu voltes. Eu prefiro morrer em vergonha do que te deixar voltar pra mim. Mas não é uma carta de despedida, é simplesmente um registro, quase uma confissão. Deixo aqui acordado que sim, tu foste tudo pra mim por muito tempo. Pro teu ego e orgulho, eu acho que isso vale de algo. Deixo aqui também declarado e explícito que eu sou sim, grata e muito por tudo que tu me fizeste, porque foram as tuas facadas na minha consciência que me deixaram do jeito que eu sou, e ainda bem que eu sou assim. Então eu agradeço por isso. Entretanto eu deixo por aqui os agrados do teu ego. Nunca mais. Nunca mais eu vou fazer qualquer coisa por ti, nem deixar que tu faças nada por mim, pra mim, em mim. A relação já acabou há algum tempo, mas ainda é muito recente, eu acho. Gosto de deixar tudo por escrito, tu sabes melhor do que ninguém como eu sou. Quero também deixar tudo bem claro, sem espaço para interpretações alternativas. E como sem mim tu não existes, considere isso não uma carta de despedida, mas uma sentença de morte. Teu primeiro e último ode e também teu atestado de óbito.

Não te preocupa. Teu nome é o meu nome e eu nunca vou me esquecer de ti. Um pedacinho de ti vai viver num canto da minha memória, mas é só pra que eu não deixe a história se repetir.

15 comentários:

  1. Incrível... Incrível.

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  2. Parabéns, Ana, ótimo texto. Me identifiquei em algumas partes. Curti muito.

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  3. Ana, esse texto é incrível! Fiquei surpresa assim que comecei a ler porque se relaciona muito com uma crônica que eu escrevi no começo do ano (principalmente o primeiro parágrafo). Eu, infelizmente, já devo ter perdido porque escrevi numa folha solta, mas a história era sobre uma mulher que teve uma relação muito intensa de amizade/amor no passado e ela se dá conta que é por causa desse relacionamento que ela tem inseguranças, age, pensa e sente de certo modo. É como se a vida dela se baseasse no que ela viveu e aprendeu com esse cara, não sei se dá pra entender. Sendo que na crônica, mesmo ela tendo "se livrado" (fisicamente) ela ainda vive meio atormentada por não conseguir se libertar das influências dele.

    Enfim, não sei nem se deu pra entender direito a história, mas quando eu li o texto super pensei que seria algo que ela escreveria e tinha que compartilhar com alguém (aqui pareceu mais apropriado), porque mesmo tendo partes que divergem da personagem, achei muito relatable e também isso nunca tinha acontecido antes haha.

    Amo o seu blog, o jeito que você escreve sempre envolve muito! Esse, agora, é um dos meus textos favoritos. Espero que atualize com mais frequência e desculpa se o comentário sair gigante (não dá pra ter noção escrevendo aqui) :)

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  4. ler esse blog ouvindo maysa deve ter sido a coisa mais poética que eu já fiz na minha vida

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  5. Obrigada por esse texto.

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  6. Que maravilha! Tu escreves muito bem.

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  7. Achei fraco. O texto em si é muito repetitivo e é de grande semelhança com o típico chororô de muito adolescente quando chega ao fim o relacionamento de seu primeiro amor. Não tem grandes arranjos e nada reflexível, também. Acho que tu tens capacidade pra muito mais, mocinha!

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  8. Que delícia, Ana. Quero colocar teus textos numa caixinha enfeitada de corações e ficar admirando todos os dias. Acho incrível a sua capacidade de escrita, tu te deixas cair numa agradável sintonia com as palavras, cada vez melhor. Gostaria de deixar este breve comentário sobre como gosto de vir aqui e saber que tu atualizaste a página com mais uma maravilha dessas! Grande beijo.

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  9. Absurdamente maravilhoso, e foi o que, inclusive, me motivou a ir te pedir o conselho que ajudou muito na minha vida. {:

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  10. Completamente incrível. Me identifiquei. Parabéns.

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  11. Fraco. Bem fraco. Eu acho que no texto tu se refere a si mesma, no passado, mas ainda que dê vertentes para outras interpretações, é bem fraco. Esperava mais.

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